Religião e mitologia se confundem.
Não sei se é correto afirmar que religião É mitologia, mas parece não está muito longe disso.
Mitologia sempre expressou aquilo que o LOGOS (conhecimento, certeza, fato) não podia satisfazer.
O homem é um ser MYTHOS (sentimento, alma, fé), e portanto é natural que sempre tenha recorrido a símbolos mitológicos para expressar sua insuficiência diante dos fenômenos transcendentes (a morte, a perda, o sofrimento, a busca de sentido para a existência).
Após alguns milhares de anos ainda somos seres que procuram símbolos míticos para expressar sentimento.
Porém nada há de errado com a mitologia. O que mudou foi a maneira como o mundo passou a interpretar a coisa.
Até o século XV as pessoas celebravam a mitologia não como uma verdade a ser crida, mas como uma expressão de seu ser religioso diante do TODO incompreensível, insondável, Àquele que era percebido no mais recôndito da experiência humana, tanto coletivamente quanto pessoal. Realidade e mitologia estavam intimamente atados. O dia a dia das pessoas era um ritual aos deuses que sustentavam a vida em sua plenitude e davam sentido a cada expressão da atividade humana.
Foi à partir deste século, porém, que a visão de mundo se modificou (e com ela a visão sobre religião).
As descobertas científicas iniciaram um rompimento entre mitologia e realidade de forma indelével. Criou-se o conceito formal de VERDADE associado apenas a fatos que pudessem ser cientificamente comprovados. Esse processo se consolidou com a inauguração da imprensa escrita: colocados no papel, documentalmente, as histórias tinham que ser aferidos, comprovados. Havia, agora, um compromisso com a nova sociedade tecnicista e comercial, onde as formas de se relacionar passavam a ser firmadas através de contratos registrados em cartório para que pudessem "ter fé".
Essa nova visão além de destruir o sentido ritualizado e simbólico da religião, inaugurou uma nova postura frente à religião e que persiste até hoje:
1.O crente precisa CRER que aquilo que ele lê na bíblia é uma verdade factual (aconteceram DE FATO), caso contrário está indo de encontro à verdade;
2.O cético que passou a depreciar as histórias bíblicas como nocivos a uma sociedade que não pode continuar acreditando em lendas e mentiras se quiser progredir tecnologicamente rumo a uma religiosidade utilitária.
Tanto um quanto o outro ponto de vista são posturas essencialmente infantis diante de um contexto muito maior que qualquer compreensão que possamos ter sobre temas transcendentes (Deus, vida eterna, morte).
Religião é CAMINHO (Atos 19:9, 23; 22:4; 24;14), não um fim em si mesmo, algo sobre o qual devemos ter expectativas presente ou futura no sentido literal.
Quando os símbolos religiosos passam a ser sacralizados como verdades absolutas e imutáveis, também passam a ser idolatrados. Como consequência Deus, na sua suficiente incompreensão, passa a ser antropomorfizado e adorado como qualquer ídolo das antigas civilizações. Adorar Deus não satisfaz o Seu ego (ainda que este conceito seja mais uma antropomorfização), mas o nosso.
Religião é para ser ritualizada (não como fato, mas como verdade da alma), vivida, praticada com atos de solidariedade, compreensão e amor.
Se era intensão de Jesus ser adorado como Deus teria ele nascido em uma manjedoura, comido com os pecadores, vivido com um humilde carpinteiro em uma cidadezinha pobre, padecido como um ladrão e morrido como um pária?
Séculos de barbaridades cometidas "em nome de Deus" demonstram que durante este período tivemos mais "adoradores de Deus" do que praticantes e ouvintes de seus ensinamentos: muitos estão dispostos a adorá-lo, mas poucos a ouví-lo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário